quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Pedaços de mim achados ali

Dizem que a primeira década e meia de idade são os anos eternos da nossa vida, não por haver aqui um impedimento no caminho da maturação, mas porque os dias passam como se não passassem. 
Já os meus, correram e bem. 

Na altura, talvez por ser demasiado nova e despreocupada, cada dia prosseguia a sua marcha em câmara lenta, sem pressa de encontrar a noite que, por sua vez, demorava a surgir o mais que pudesse, talvez dançando com as estrelas no auge da escuridão no outro lado do mundo. Não se sabe ao certo quando tempo dura esta fase a que intitulam de a mais feliz na vida; manifesta-se até quase à idade adulta nuns, sendo a tumultuosa travessia pela adolescência suavizada pela ideia de que o relógio da vida não corre, e acaba cedo demais para outros, quando estes não tiveram sequer tempo de provar o poço da eternidade juvenil. Não sei se use o advérbio de modo infelizmente, ou se opte por ir contra os ideais de algumas pessoas e o considere uma graça de Deus (ironismos ateístas à parte) - deixo ambas as vertentes no prato e sirvam-se da que quiserem -, mas a verdade é que comecei a viver cedo demais. Não me refiro à vida física, obviamente, pois essa está em nós antes mesmo do nosso nascimento, começa no meio intrauterino; refiro-me sim à vida psicológica, essa que só tende em aparecer quando encontramos outro caminho que nos leva além do refúgio dos sonhos e quando tomamos conhecimento da contagem decrescente da duração da vida. Há quem nunca alcance este caminho, morre ignorante e feliz. Nem sabem eles como os invejo; ou talvez este seja apenas o meu lado vazio a falar.
À medida que vou percorrendo a estrada da vida, os anos passam por mim como ventos fortes, desmoronam-me à sua passagem, fico em peças, não me sei montar. Perco-me em mim mesma e não me conheço mais, enquanto os outros se limitaram a abraçar a passagem do tempo e apenas sentiram uma leve aragem nas suas vidas. Porque não me identifico com os outros, porque não sou igual a eles? Porque penso tanto? Não poderia simplesmente limitar-me a sentir e a viver o momento? Não, essa não sou eu.

Afinal

Quem sou eu? Talvez um misto de emoções contidas e umas quantas palavras que ficaram por dizer. Um excesso de expressividade não expressa, um amontoado desordenado de pensamentos, um rabisco inacabado, um conjunto de incertezas. Alguém que não se limita a pensar na vida, mas também no porquê dela; alguém que se sente incompreendida numa sociedade em que não se enquadra.

Ou se calhar não sou nada disto. Serei realmente alguém? Ou não passarei de mais um ponto no vasto universo?

Estou perdida, não quero ser encontrada. Deixem-me naufragar nesta maré de incertezas sem resposta.


O tempo passou, o autodesconhecimento aumentou.

[Incosciência. Vento. Fragmentação.]



inspirado em Fernando Pessoa Ortónimo